terça-feira, 12 de julho de 2016

A nova Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LEI 9.394/96): DESTAQUES, AVANÇOS E PROBLEMAS



A nova LDB: destaques, avanços e problemas. Salvador: Revista de Educação CEAP, ano 5, no. 17, junho de 1997, p. 05 - 21.
Andrea Cecilia Ramal
"Esta lei procura libertar os educadores brasileiros para ousarem experimentar e inovar." (Darcy Ribeiro)
A Lei 9.394/96 contém as Diretrizes e Bases que vão orientar a educação nacional nos próximos anos. Seus 92 artigos representam um novo momento do ensino brasileiro; neles vemos refletidos muitos dos desafios e esperanças que movem o trabalho de tantos educadores numa nação de realidades tão diversas.
Este artigo se propõe destacar alguns dos aspectos mais significativos envolvidos nas mudanças que a Lei apresenta. Em seguida, analisamos os elementos que nos parecem constituir avanços com relação ao contexto educacional do momento, aos quais contrapomos também algumas questões que são ou que podem vir a se tornar problemáticas, em função do modo como o texto for interpretado ou da maneira como for conduzida a implementação de certas mudanças.
Breve histórico da Lei 9.394/96
Em 1988 já corria no Congresso Nacional o processo de tramitação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). Tratava-se então do projeto apresentado pelo Deputado Federal Otávio Elízio (PSDB/MG); o relator era Jorge Hage (PDT/BA).
O texto seria aprovado na Câmara dos Deputados em 13 de setembro de 1993, depois de receber 1.263 emendas. O projeto original, modificado em longas negociações na correlação das forças políticas e populares, ia para a avaliação do Senado reduzido, contendo 298 artigos.
O relator no Senado Federal, Cid Sabóia (PMDB/CE), dá seu parecer e a Comissão de Educação do Senado aprova o então Projeto de Lei 101/93 no dia 20 de novembro de 1994.
Um dado novo atropela o processo: o senador Darcy Ribeiro apresenta um substitutivo do projeto, alegando inconstitucionalidade de vários artigos[1]. Por requerimento do senador Beni Veras (PSDB/CE), o PL 101/93 - que já estava no Plenário do Senado - é retirado. O Presidente do Senado, José Sarney, decide retomar a tramitação dos três projetos: o antigo PL 101/93 da Câmara, o parecer de Cid Sabóia aprovado pela Comissão de Educação e o substitutivo Darcy Ribeiro. Este último é designado para atuar como relator. Ao apreciar as emendas do PL 101/93, Ribeiro notoriamente toma como referência seu próprio projeto e as suas concepções de Educação.
Contando com uma espécie de consenso entre os senadores, o substitutivo Darcy Ribeiro, que contém apenas 91 artigos, é colocado em evidência, considerado mais enxuto e não detalhista.
No dia 14 de fevereiro de 1996 é aprovado no plenário do Senado o Parecer nº 30/96, de Darcy Ribeiro. Esta decisão não só tira o projeto inicial da LDB de cena, como também, de certo modo, nega o processo democrático estabelecido anteriormente na Câmara e em diversos setores da população ligados à Educação[2].
A Lei 9.394/96 é promulgada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República com data de 20 de dezembro de 1996, e publicada no Diário Oficial em 23 de dezembro de 1996.
1a. parte: Diretrizes e Bases para a Educação Nacional - alguns destaques
1. O currículo
Os currículos do ensino fundamental e médio passam a compreender uma base nacional comum que deve ser complementada por uma parte diversificada, de acordo com as características regionais (art. 26).
Fica sugerida uma flexibilização dos currículos, na medida em que se admite a incorporação de disciplinas que podem ser escolhidas levando em conta o contexto e a clientela. No ensino nas zonas rurais, é admitida inclusive a possibilidade de um currículo apropriado às reais necessidades e interesses [desses] alunos (art. 28, inciso I).
A LDB determina que a Educação Artística seja componente curricular obrigatório no Ensino Básico (pré-escolar, 1º e 2º graus; art. 26, § 2º). O objetivo é promover o desenvolvimento cultural dos alunos.
Continua a exigência de uma língua estrangeira moderna a partir da 5ª série, e pedem-se duas línguas (uma opcional, de acordo com as possibilidades da Instituição) no ensino médio.
Entre os saberes que o educando deverá dominar após o ensino médio estão os conhecimentos de filosofia e de sociologia necessários ao exercício da cidadania (art.36, § 1º); contudo, a Lei não exige que tais disciplinas sejam incorporadas ao currículo.
O Ensino Religioso passa a ser disciplina de oferta obrigatória nas escolas públicas, com matrícula facultativa e sem ônus para os cofres públicos (Art. 3).
2. A avaliação
Termina a exclusividade do exame vestibular para ingresso no Ensino Superior (art. 4, inciso I). A LDB fala de uma classificação mediante processo seletivo, sem especificar. Podemos entender, por exemplo, as notas do 2º grau, ou uma prova aplicada pelo MEC[3].
A LDB cria o processo de avaliação das instituições de educação superior, assim como do rendimento escolar dos alunos do ensino básico e superior.
No ensino superior, o MEC pode, mediante análise dos resultados da avaliação, descredenciar cursos, intervir na instituição, suspender temporariamente a autonomia, rebaixá-la a Centro Universitário (centros sem a exigência de trabalho de pesquisa), ou mesmo descredenciá-la. Passa a ser solicitado, além disso, o recredenciamento das universidades a cada cinco anos.
Quanto à avaliação dos alunos do ensino básico por parte do governo, não há maiores especificações.
A classificação dos alunos nas séries iniciais passa a poder ocorrer por promoção. Este termo (diferente de aprovação) é identificado também no texto com a "progressão continuada" ou a "progressão parcial" e com a "progressão regular por série". Consiste na aprovação automática de alunos da 1ª até a 5ª série, pressupondo um acompanhamento personalizado, com o fim de evitar a evasão escolar e a repetência nos primeiros anos de estudo. Esse sistema não é uma inovação da LDB, mas fica por ela legitimado (art.24; art.32, inciso 2º).
Isso abre a possibilidade de uma nova concepção de série. O artigo 23 rege que a educação básica poderá ser organizada tanto em séries anuais como em períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos não seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar.
Nos termos da lei, a verificação do rendimento escolar deve ser contínua e cumulativa, e a recuperação deve dar-se, de preferência, paralelamente ao período letivo (art. 24). Continua a exigência do mínimo de 75% de freqüência, exceto para os sistemas de ensino não presenciais (educação à distância).
3. Papel e formação dos professores
A nova LDB dá atenção específica à questão dos professores e procura valorizar o magistério, estabelecendo critérios de ingresso e falando da necessidade do plano de carreira nas instituições (art. 67). Na descrição das funções dos docentes, afirma que eles: "participam da elaboração da proposta pedagógica das escolas"; "elaboram e cumprem planos de trabalho"; "zelam pela aprendizagem dos alunos"; estabelecem estratégias de recuperação"; "ministram os dias letivos estabelecidos e participam integralmente do planejamento/ avaliação"; "articulam escola/família/comunidade" (art.13).
O texto explicita que seja assegurado ao profissional da educação: "o aperfeiçoamento continuado, inclusive com licenciamento periódico remunerado"; um "piso salarial profissional"; a "progressão funcional baseada na titulação ou habilitação, e na avaliação do desempenho"; um "período reservado a estudos, planejamento e avaliação incluído na carga [horária]"; e "condições adequadas de trabalho" (art. 67).
São criados os Institutos Superiores de Educação, para preparação de docentes em nível superior (curso de licenciatura, graduação plena) como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental (art. 62).
No artigo 63 lemos que tais Institutos Superiores manterão:
a) cursos formadores de profissionais para a educação básica, inclusive para o curso normal superior; b) programas de formação pedagógica para portadores de diploma de educação superior que queiram se dedicar à educação básica[4]; c) programas de educação continuada para os profissionais da educação.
A LDB rege ainda que a formação docente, exceto para a educação superior, inclua prática de ensino de, no mínimo, 300 horas (art. 65).
4. Ensino à Distância
Os programas de educação à distância são incentivados pela nova LDB (art. 80, § 4o.) em todos os níveis e modalidades do ensino, desde que as Instituições a oferecê-los estejam devidamente credenciadas. Nesse tipo de ensino estão compreendidos desde os cursos como o que certas universidades oferecem em convênio com Centros Pedagógicos ou escolas, por exemplo, tendo como instrumentos de trabalho materiais escritos e livros, até as transmissões de informações por canais especiais de televisão e a conexão à Internet.
5. Outros destaques
· A denominação dada aos níveis escolares é: Educação Básica (compreende a educação infantil, o ensino fundamental (anteriormente 1o. grau) e o ensino médio, anterior 2o. grau); e Educação Superior.
· O Ensino Fundamental (8 anos) aparece sempre como prioridade. Sendo dever do Estado, qualquer cidadão ou entidade de classe pode acionar o Poder Público para exigi-lo (art. 4º/5º).
· A carga horária mínima anual da educação básica é de 800 horas em 200 dias letivos, sem contar os exames finais. A jornada escolar no ensino fundamental inclui pelo menos quatro horas de trabalho efetivo em sala de aula, mas o artigo 34 prevê que o período de permanência na escola seja progressivamente ampliado.
· A educação profissionalizante passa a constituir um curso independente do Ensino Médio.
· A LDB chama a atenção para a necessidade de se alcançar relação adequada entre o número de alunos e o professor, acenando para uma redução do número de alunos em cada sala de aula, porém sem especificar (art. 25).
· A rede pública de ensino deverá ampliar seu atendimento aos alunos com necessidades especiais de aprendizagem (art. 60 - parágrafo único).
· A LDB rege que os recursos financeiros destinados à Educação sejam, do orçamento da União, nunca menos de 18%; dos Estados e Municípios, nunca menos de 25%. Abre-se a possibilidade, sem muita clareza de critérios, de que tais recursos possam ser dirigidos também a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas (art. 69 e art.7), inclusive para bolsas de estudo para a educação básica se não houver vagas na rede pública de domicílio do educando, comprovandose a insuficiência de recursos.
· As universidades públicas são obrigadas a oferecer ensino noturno com a mesma qualidade e estrutura material disponível dos cursos diurnos; o poder público (União, Estados e Municípios) deve oferecer ensino supletivo gratuito.
· A LDB exige o mínimo de um terço de professores com titulação de Mestrado ou Doutorado para que as instituições sejam reconhecidas como Universidades. Estas terão oito anos a partir da data em que a Lei entrou em vigor para se adequarem.
· Classificação das instituições de ensino (art.20): poderão ser enquadradas nas categorias privada, comunitária, confessional e filantrópica. A escola confessional deve poder continuar acumulando, em casos específicos e na forma da lei, as funções e atribuições da filantrópica.
· As atribuições dos diferentes sistemas ficam assim determinadas: Sistema Federal de Ensino
Sistema Estadual de Ensino
Sistema Municipal de Ensino
· Escolas mantidas pela União · Ensino Superior privado
· Órgãos federais de Educação
· Escolas mantidas pelo Estado · Ensino superior mantido pelo Município
· Ensino fundamental e médio privado
· Órgãos de educação estaduais
· Escolas municipais · Educação infantil privada
· Órgãos municipais de Educação
· Fica instituída a Década da Educação, a iniciar-se um ano depois da data de publicação da LDB. A União tem um ano para encaminhar ao Congresso Nacional o Plano Nacional de Educação. O ano de 1997 é o período para adaptação das legislações educacionais e de ensino da União, dos Estados e dos Municípios às disposições da 9.394/96. As instituições escolares devem ainda receber destas instâncias os seus prazos de adaptação.
· Institui-se o Conselho Nacional de Educação (art. 9º, § 1º), herdeiro do antigo Conselho Federal de Educação (1962 - 1994). Terá funções de normatização e assessoramento, com uma inovação: seus membros podem ser indicados pela sociedade (Lei 9.131/95), o que pretende evitar a interferência da política partidária neste processo.
2a. parte Avanços e Problemas
A Lei 9.394/96 representa um passo à frente no âmbito da descentralização do processo educativo, dando certa autonomia às escolas e flexibilizando também a gestão dos centros de ensino superior. Embora sujeitas a avaliação e até passíveis de descredenciamento pela União, as universidades podem: deliberar sobre critérios e normas de seleção e admissão de estudantes a seus cursos (art. 51); criar, organizar e extinguir cursos e programas de educação superior; fixar os currículos de seus programas, dentro das diretrizes gerais; elaborar e reformar seus próprios estatutos e regimentos; administrar os rendimentos (art. 53); decidir sobre ampliação e diminuição de vagas (art. 53, § único); propor o seu quadro de pessoal docente e seu plano de cargos e salários (art. 54, § 1º), entre outras atribuições que lhes são conferidas. Nesses termos, a tendência para o MEC deve ser de não atuar mais como um regulador, mas sim como coordenador ou articulador do grande projeto nacional, concedendo a autonomia imprescindível a um espaço que se propõe desenvolver trabalhos de pesquisa e investigação científica. Ao mesmo tempo, o crescimento da autonomia se transforma em exigência de inovação para as universidades: não há sentido na repetição de velhas práticas se, a partir de agora, é possível começar a empreender mudanças.
A LDB demonstra preocupação clara com as principais questões da educação brasileira, tais como:
è Funcionamento e duração da educação básica, determinando claramente períodos a serem cumpridos e estabelecendo diretrizes básicas de organização do ensino (a Lei abre ainda a possibilidade de que cada escola elabore seus calendários escolares, o que pode representar um melhor atendimento às especificidades de cada clientela); è A necessidade de o aluno permanecer mais tempo de seu dia no espaço escolar, e menos tempo de sua vida na escola (principalmente pelo término da repetência nas primeiras séries). A previsão de ampliação do número de horas do aluno na escola prevista no artigo 34 não tem prazo definido, mas é uma proposta que está em sintonia com as tendências dos mais modernos métodos pedagógicos.
É possível que Darcy Ribeiro estivesse propondo, com este projeto, um modelo de escola semelhante ao dos CIEPs, centros integrados que criou no Rio de Janeiro, com provável inspiração nas teorias do ensino compensatório, já muito criticadas e inclusive descartadas enquanto possibilidade de superação das desigualdades educacionais. Mesmo assim, esta idéia tem pontos positivos, na medida em que estimula a presença e a participação na vida da comunidade escolar, além de propiciar aos alunos de classes de baixa renda a possibilidade de trabalhar no próprio estudo num ambiente muitas vezes mais adequado do que o de suas casas.
Tal prática deve implicar uma reestruturação paulatina dos centros de ensino, no sentido de se adaptarem às necessidades que o regime de semi-internato envolve (maior número de docentes na escola ou aumento do período de permanência dos professores no espaço escolar, destinação ou construção de locais apropriados para o estudo do aluno, ampliação das propostas da escola a outros setores da formação humana, como práticas esportivas, cursos de música e outras artes, etc.) è A inserção da transdisciplinaridade nos novos currículos, sugerida no momento em que se admite uma parte diversificada para completar a base nacional curricular comum. A educação da era da informação não pode mais se fechar num único parâmetro curricular. Novas propostas de ensino, baseadas na busca coletiva do saber e na possibilidade do aluno fazer a própria construção do conhecimento, devem aliar o saber local e o global, voltando-se para a abrangência e a flexibilidade de conteúdos. Isso não significa necessariamente entrar nos moldes da globalização, e sim buscar o universalismo.
Além disso, muitos educadores vêem a nova lei com bastante esperança na possibilidade de ir transformando o currículo em função de enfoques educativos mais voltados para a formação humana, como também de ir adequando os conteúdos às necessidades dos seus alunos. Sendo o Brasil um país de realidades tão diversas, é inevitável que tenha também escolas muito diferentes e mesmo classes muito heterogêneas numa mesma escola. No esforço de tornar cada uma destas instituições um espaço escolar de qualidade, a redefinição dos parâmetros curriculares será fundamental.
è A urgência de se revalorizar a profissão do magistério. A LDB é promulgada num momento decisivo para o professor, considerando o dado da progressiva introdução do computador e da televisão na escola. Há muitos docentes que vêem essa nova realidade como uma ameaça: o computador seria seu substituto definitivo. Nesse âmbito, o texto é muito feliz, pois reconhece e estimula as possibilidades de um ensino à distância e de um ensino presencial moderno e renovado, que supõem evidentemente o emprego das tecnologias; e, ao mesmo tempo, destaca o amplo papel do professor, caracterizando-o não como mero docente, mas como zelador da aprendizagem (art. 13, I), colaborador na articulação entre escola e comunidade (art. 13, VI)[5].
è Nova concepção de avaliação na escola. O sistema de promoção continuada tem o aspecto positivo de se fundamentar na personalização do ensino, visando a atender aos múltiplos ritmos de aprendizagem e às diversas capacidades individuais dos alunos. A filosofia subjacente a essa prática é a de que a diferença não seja mais vista como um desvio a ser condenado e reprovado, mas como uma riqueza de cada personalidade, a ser descoberta e valorizada.Além disso, o novo conceito de série, que tanto admite períodos anuais como semestrais, ou ainda ciclos e grupos não seriados, conforme a maior conveniência do processo de aprendizagem, é uma verdadeira inovação no ensino brasileiro.
Desde já está implicada aí uma nova configuração da escola que deverá gerar inúmeros benefícios, desde que essa estrutura mais flexível seja implantada com a devida seriedade e a necessária organização.
è Visão abrangente do conceito de educação, sem limitá-la ao mundo escolar. O artigo 1º expressa que a educação "atinge os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais". Entre os princípios da educação nacional ficam assumidos a "liberdade de aprender/ensinar/pesquisar", o "pluralismo de concepções pedagógicas", a "tolerância" (art. 3º). Isso reforça a idéia de um ensino descentralizado, em que cada escola assume seus próprios objetivos de ensino, e constrói seu projeto pedagógico próprio. Esta idéia é reforçada em outras partes da LDB (art. 12).
è Estímulo à educação à distância. Esta disposição é bem relevante, considerando as dificuldades de acesso à escola por parte das populações de diversas cidades do interior, bem como a necessidade de uma melhor qualificação para o mercado de trabalho por parte dos profissionais que não têm tempo de freqüentar cursos regulares, e a urgência de um aprimoramento profissional dos corpos docentes das diversas instituições de ensino do Brasil.
Embora reconheçamos significativos avanços na Lei 9.394/96, não podemos deixar de apontar também alguns problemas:
Conceito de Educação Básica A Lei 5.692/71 estabelecia como básico o ensino de 1o. grau. A nova Lei amplia esse conceito, considerando como básica para um cidadão a formação que engloba o ensino fundamental e o ensino médio. Isso é positivo idealmente falando, mas preocupa quando confrontado com a realidade de nosso país, em que poucos têm acesso às séries superiores. Esperemos que esse conceito não acentue a já grande discriminação dos saberes dos não-escolarizados.
Base nacional comum no currículo Apesar de que se verifique certa liberdade na complementação dos currículos, a base nacional continua sendo única e definida por instâncias exteriores às escolas. Ficam as questões quanto à adequação da relação entre disciplinas e cargas horárias a elas destinadas, e quanto ao equilíbrio na dosagem entre matérias que priorizam a formação dos aspectos humanos e matérias mais voltadas para o campo do científico-tecnológico.
As funções do professor Quando a Lei fala dos profissionais da educação básica, restringe suas funções a: administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional. Não está prevista, portanto, a categoria de pesquisador. Isso mantém a distância dos centros de ensino básico da pesquisa universitária, limita o registro e a troca das experiências pedagógicas bem sucedidas, e não abre ao profissional da escola a possibilidade de se debruçar sobre sua própria prática como objeto de estudo, pesquisa e transformação.
Número de alunos em sala Muitas questões de interesse dos docentes que têm experiência no trabalho pedagógico ficam esquecidas ou não são claramente explicitadas, como por exemplo a real necessidade de se diminuir o número de alunos em sala de aula. Este é, inclusive, um exemplo para ilustrar a crítica que tem sido feita à nova LDB: por ter pretendido ser tão enxuta, peca muitas vezes pela falta de definições mais claras e específicas. Várias diretrizes são deixadas para o Plano Nacional de Educação, o que acaba não permitindo que se avalie desde já o grau de muitas das mudanças propostas.
Critérios de ingresso à universidade A abolição do sistema de vestibular como única forma de ingresso às universidades não parece garantir a priori que o ensino superior se torne mais democratizado ou que a qualidade acadêmica dos que ingressam melhore substantivamente. Além de não ficar definido o processo a ser implementado, são várias as questões que surgem diante das idéias já levantadas: Caso seja pelo sistema de comparação de notas do 2º grau, como serão avaliados alunos de escolas com níveis diferentes de exigência? Se for estabelecido um exame nacional único: quem o elaborará? sob que critérios? não será um outro modo de dizer "vestibular"? os alunos hoje excluídos por falta de condições terão mais acesso ao ensino superior?
Avaliação das instituições de ensino Um dos aspectos mais problemáticos da Lei 9.394/96 é o da avaliação das instituições de ensino, começando pelas universidades, a despeito da autonomia concedida a elas em muitos aspectos. Esse processo não deixa de ser uma forma encontrada pelo Poder Público de exercer um maior controle sobre a produção docente e discente, buscando padrões cada vez mais adequados a um modelo de universidade pré-definido e em concórdia com o sistema. Algumas questões problemáticas se relacionam com a dúvida quanto aos critérios de avaliação, quanto às concepções pedagógico-administrativas dos avaliadores, ou quanto aos critérios de diferenciação entre quantidade e qualidade da produção acadêmica.
Todos sabemos dos poderes envolvidos num simples processo de avaliação de um grupo de alunos - que dizer de todo um centro acadêmico. Avaliar é, inevitavelmente, exercer um controle sobre os avaliados e, no caso de instituições, corre-se o risco de um comprometimento da autonomia necessária ao gerenciamento dos processos educacionais.
Além disso, há pesquisas que demonstram que os aprovados no vestibular não são necessariamente os alunos mais preparados para o ensino universitário, assim como, analogamente, os reprovados não são necessariamente os menos aptos. Pode haver ocorrido um processo de treinamento para a resolução de tipos de questões que garante resultados que ocultam o verdadeiro estado intelectual e afetivo daquele que é examinado. Graças a essa possibilidade disseminaram-se os cursinhos preparatórios em diversas capitais do país, especializados em treinar para a aprovação nas principais universidades, sem maiores preocupações com o processo educativo globalmente entendido. Com a avaliação que o governo prevê, seja das escolas ou das universidades, um dos riscos é justamente o da multiplicação de cursos especializados no treinamento de alunos para o tipo de exame a ser aplicado, frustrando os objetivos do teste. Ao mesmo tempo, dependendo do tipo de prova, sabe-se que não necessariamente os que estiverem melhor classificados serão os mais capazes para exercer as respectivas profissões. Aspectos qualitativos e subjetivos não podem ser medidos em poucas horas de um exame escrito, mas sim na avaliação permanente realizada pelos professores que acompanham o processo de ensino-aprendizagem desses estudantes.
Os poderes atribuídos a esse instrumento de avaliação são grandes. No caso das universidades, o resultado do Exame Nacional de Cursos (ou do Provão, como pejorativamente também é chamado) é um dos critérios decisivos para a idéia que se faz do estado de um curso e para a avaliação de seu (des)credenciamento. Ora, quando se aplica um teste a um aluno no final de sua passagem pelo ensino superior, na verdade está se avaliando apenas o produto, e não o processo. Aí já teríamos outra concepção discutível: a de que a qualidade do produto revela a qualidade do processo.
Outro aspecto problemático diz respeito à interpretação dos dados obtidos na avaliação. As deficiências das instituições educacionais brasileiras (especialmente a escola) se relacionam, mais do que com elementos como a adequação de currículos, a distribuição de materiais didáticos, a pertinência das metodologias empregadas ou mesmo eficiência ou ineficiência dos recursos humanos e das administrações escolares, com questões que dizem respeito às desigualdades profundas de ordem sócio-cultural entre as classes. Os problemas educacionais brasileiros são, antes de tudo, questões políticas e sociais, e não podem ser transformados em questões técnicas[6].
Essa linha de interpretação que prioriza o técnico sobre o político-social é uma das que encontram na GQT (Gestão da Qualidade Total) o caminho para as melhorias nos níveis educacionais. Entretanto, essa retórica da qualidade pode estar, muitas vezes, revestindo concepções ideológicas de reforço do sistema vigente e manutenção dos poderes já estabelecidos. Até o momento, as teorias que defendem a implantação da qualidade nos sistemas educacionais não conseguiram dissipar as dúvidas sobre este programa, tão criticado por estabelecer critérios de diferenciação baseados nas possibilidades de poucos, e por se fundamentar na exclusão e afastamento dos menos aptos.
Na verdade, a idéia de avaliar as instituições desse modo não é nova: já na década de 60 Hans Thias e Martin Carnoy realizavam seu estudo sobre um conjunto de escolas do Quênia, aplicando testes aos alunos. Sem ir tão longe, projetos semelhantes ao do Brasil aparecem nos governos do Chile e da Argentina. Em Mendoza, por exemplo, implantou-se em 1993 o Sistema Provincial de Avaliação da Qualidade da Educação, programa que avaliou os alunos que terminavam a escola primária e secundária através da aplicação de provas de Língua e de Matemática. Com os resultados obtidos elaborou-se um ranking das escolas.
É claro que avaliar-se continuamente é uma postura imprescindível para todo aquele que participa de um processo educativo, mas os instrumentos e as formas de avaliação devem ser mais discutidos, assim como o que fazer com os resultados. A rankingmania de que sofrem muitos países se identifica com o que Pablo Gentili chama de pedagogias fast food[7], numa comparação com a cadeia McDonald’s, reproduzindo sua noção de mérito, a função exemplificadora do quadro de honra e a filosofia do você pertence ao quadro dos campeões - num julgamento em que os critérios são estabelecidos unicamente pelo avaliador, e premiam a adequação às suas expectativas.
O simples fato de medir a qualidade não significa, por inerência, melhorar a qualidade; nem mesmo podemos afirmar que a qualidade de um trabalho educativo possa ser medida (apenas) através de provas de conteúdos específicos[8]; indo mais longe, nem sequer podemos afirmar com certeza, na verdade, se a qualidade é algo mensurável. Instaurar um processo massivo de avaliação pode significar aperfeiçoamento e excelência, mas pode ser também uma forma de controle político-ideológico. Cabe à sociedade posicionar-se ativamente frente a estas questões, por exemplo através de seus representantes no Conselho Nacional de Educação, órgão que certamente terá incidência sobre esse processo.
Os entraves do contexto Algumas das determinações da nova LDB encontram entraves no próprio contexto sócio-econômico do país ou na vontade política dos mesmos governantes que a aprovaram. A educação fundamental se tornará, efetivamente, uma realidade para todos os cidadãos brasileiros? O profissional da educação será revalorizado em todas as formas que a Lei propõe? Caso os recursos financeiros destinados à educação atendam aos valores préestabelecidos, chegarão a seu destino último, a escola? Esses questionamentos fazem chegar à necessidade de que seja estabelecido um programa de apoio para que a Lei seja realmente cumprida e as novas diretrizes sejam implantadas[9].
Sistema de promoção continuada O sistema de promoções continuadas que substituem a reprovação/aprovação no ensino fundamental é problemático, pois exige que se faça uma educação personalizada, atenta aos processos individuais de aprendizagem. Considerando o nível de formação de muitos professores da escola pública, as baixas remunerações e o número excessivo de alunos em sala de aula, esta prática aparece como, no mínimo, desafiadora.
Educação à distância que realmente supere as distâncias A educação à distância é outro componente de importância crucial na definição da qualidade do ensino brasileiro. Esperamos que seja implantada com a devida seriedade e o necessário rigor acadêmico, para que o processo tenha como resultado o real crescimento dos alunos por ela beneficiados. O ensino à distância foi concebido justamente para que as distâncias sejam vencidas. O modo de articular os meios tecnológicos com a mediação dos professores será decisivo nesse aspecto.
O público e o privado A questão dos setores público e privado no ensino ainda não fica totalmente definida na Lei 9.394/96. Ora o texto afirma que as verbas públicas se destinam ao ensino público (art. 7o., I; art. 69), ora abre essa possibilidade para as instituições privadas (art. 70, VI; art. 7). A idéia de liberdade de ensino fica localizada apenas na possibilidade da existência de ensino privado, mas não garante ao cidadão comum a liberdade de escolher a escola de acordo com suas crenças (o que implicaria num dever do Estado de financiar por igual tanto escolas públicas de gestão estatal como escolas públicas de gestão privada).
Ensino Religioso Na incorporação do Ensino Religioso à rede pública, como matéria de oferecimento obrigatório e matrícula opcional, consideramos três aspectos problemáticos:
com tais custos - por exemplo, as paróquias, ou a Igreja
Além disso, considerando que para tal
a) este processo deverá ocorrer sem ônus para o Poder Público, mas não é definido quem arcará ensino está previsto tanto o caráter confessional como o interconfessional, aumenta o número dos possíveis financiadores, não havendo clareza sobre que critérios serão utilizados nas decisões a esse respeito.
b) tanto o caráter confessional como o interconfessional têm a proposta de uma educação religiosa (católica ou cristã) partindo do princípio de que as crianças já sejam católicas ou cristãs. Portanto, em ambos os processos se empreende uma educação da fé na perspectiva das igreja, seja Católica, seja das demais instituições cristãs. Seria mais próprio ter pensado num ensino público sob o caráter da religiosidade, partindo do pressuposto de que provavelmente nem todas as crianças já sejam religiosas do ponto de vista das religiões, e nem todas já tenham identidade religiosa definida. Falaríamos, então, de uma educação da religiosidade voltada para a possibilidade do educando dar uma resposta de fé na perspectiva de uma antropologia aberta ao Transcendente[10].
c) A matrícula facultativa coloca o problema da motivação para o aluno. É comum que um aluno inicialmente não motivado para uma matéria acabe descobrindo nela aspectos interessantes e até deseje continuar pesquisando sobre o assunto para além das aulas. Abrir de antemão a possibilidade de recusa à freqüência a estas aulas no ensino público, apesar do elemento positivo da liberdade de escolha dada ao estudante, pode vir a impedir que muitas crianças, jovens e adultos não despertem para uma religiosidade que é elemento constitutivo de toda essência humana; pode ocasionar ainda que, mais tarde, estes mesmos alunos busquem o transcendente de modo desordenado, influenciados pelas múltiplas e confusas formas de acesso ao plano superior que vemos misturar-se no espírito do homem da pós-modernidade, criando falsos deuses, vendo poderes mágicos em elementos imanentes, etc.
Conclusões
Uma lei não é uma diretriz infalível e abstrata a partir da qual todo o contexto real vai ser ordenado. Se, por um lado, ela reflete os usos e costumes da sociedade que a produziu, e ordena a prática social no sentido de possibilitar seu controle e sua regulação, por outro ela se propõe assumir a condição de orientadora dessa prática, acenando para modos de agir e de conviver que se distanciam dessa mesma prática, procurando trazer o ideal para o real[1]. Além disso, toda legislação é também fruto das tensões de interesses, acordos e alianças envolvidos no seu processo de elaboração.
Por tudo isso, deve-se evitar um sentimento ingênuo de que, uma vez promulgada a nova LDB, todas as reformas propostas serão realizadas, assim como todas as práticas pedagógicas sugeridas serão cumpridas. Isso não ocorreu com a lei anterior (5.692/71), e provavelmente não ocorrerá com a 9.394/96.
A Lei distribui funções, atribuições e responsabilidades. Sendo sinalizadora dos caminhos a percorrer, ela não pode ser tomada como um fim em si mesma, ou como o remédio para curar as deficiências de nosso problemático sistema de ensino. As bases dessa responsabilidade social não estão no seu texto, e sim na ação de cada professor, de cada escola, de cada centro educativo.
São comuns comentários do tipo: A Lei já tem meses e até agora não saiu do papel!. Os professores, diretores, pais, alunos e demais cidadãos da sociedade que se espantarem com isso deverão perceber que não é por decreto que a educação vai mudar, como numa mágica em que, depois deste ano de implantação da LDB, o Brasil passasse a contar com um ensino democratizado, atualizado, adequado às necessidades de cada clientela, e assim por diante.
O primeiro passo já foi dado, mas o caminho a percorrer é, na verdade, ainda muito extenso.
Foram quase dez anos de tramitação, ao longo dos quais pouco pudemos inovar, desconhecendo as tendências da Lei que entraria em vigor. O texto não é ideal e faltam ajustes, mas a partir de agora é o nosso conjunto de diretrizes, as bases que vão fundamentar nossa ação pedagógica pelos próximos anos.
Nas entrelinhas dos 92 artigos escritos em linguagem jurídica podem estar as mudanças com que sonhamos em nosso cotidiano no espaço escolar.
Chegou o momento de exigi-las e ousá-las.
Referências bibliográficas
· AMAZONAS, Uilma Rodrigues de Matos. "LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: Processo político de avanços e recuos". in Revista de Educação CEAP. Salvador: Ano 4, no. 13, 1996, pags. 45 a 51.
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· BARROS, João. "O Ensino Religioso na Escola deve ser Confessional? Interconfessional? Interreligioso?" in Revista de Educação AEC. Brasília: Ano 2, no. 8, 1993, pags. 7 - 79
· CHIZZOTTI, Antônio. "Legislação e perspectiva para a Educação". in Revista de Educação AEC. Brasília: Ano 17, no. 70, 1988, pags. 17 - 20.
· FÉRES, Maria José Vieira. A LDB e a responsabilidade social das instituições universitárias: pontos para discussão. in Estudos - Revista da Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior. Brasília: ano 15, no. 18, pags. 15 - 19.
· FERRETI, Celso João. "A prática escolar frente à legislação". in Revista de Educação AEC. Brasília: Ano 17, no. 70, 1988, pags. 21 - 26.
· FORQUIN, Jean Claude. Sociologia da Educação: dez anos de pesquisa. Petrópolis: Vozes, 1995.
· GANDIM, Luís Antônio. Qualidade Total em Educação: A Fala Mansa do Neoliberalismo in Revista de Educação AEC. Brasília: AEC, ano 23, no. 92, 1994.
· GENTILI, Pablo & SILVA, Tomaz Tadeu. Neoliberalismo, Qualidade Total e Educação - visões críticas. Petrópolis: Vozes, 1994.
· Lei no. 9.394/96 - das Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
· NISKIER, Arnaldo. LDB: a nova lei da Educação. Rio de Janeiro: Consultor, 1996.
· PANINI, Joaquim "e" ROSSA, Leandro. "A nova LDB: destaques e perspectivas - documento de síntese". Texto mimeografado. Brasília, 1997.
[1] - Por exemplo, quando dispunha sobre o Conselho Nacional de Educação, alegando ser esta uma atribuição do Executivo.
[2] - Havia sido representativa a atuação, por exemplo, dos membros do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, da Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior (ANDES) e de vários sindicatos de profissionais da Educação, acompanhando as discussões, fiscalizando o andamento do processo, propondo aspectos que a lei deveria contemplar, assim como fazendo críticas e sugestões.
[3] - Há pouco tempo realizou-se a experiência do Sapiens, projeto coordenado pela Fundação CESGRANRIO, que consistia numa espécie de vestibular a longo prazo: os alunos inscritos iam prestando uma série de provas, cujo resultado final servia como base para a classificação e o ingresso na universidade. No Rio de Janeiro esse sistema não teve sucesso, em grande parte por não ter contado com a adesão das faculdades públicas. Entretanto, a CESGRANRIO considera que tal proposta se fortalece com a LDB.
[4] - O Conselho Nacional de Educação e o Ministério concordam quanto ao momento crítico que estaria se vivendo no ensino brasileiro, que exigiria um plano emergencial de formação de professores. A regulamentação desse programa está sendo trabalhada.
[5] - A LDB não menciona, no entanto, o professor-tutor, ao contrário do que vemos em outras legislaçõeseducacionais atuais - como é o caso da Espanha, França, Argentina, para citar alguns.
[6] - Sobre isso, remetemos ao artigo de SILVA, Tomaz Tadeu. A nova direita e as transformações na pedagogia da política e na política da pedagogia in Neoliberalismo, Qualidade Total e Educação. Petrópolis, Vozes, 1994. O autor pondera: Os métodos e currículos [das escolas públicas] podem ser inadequados, mas isso não pode ser discutido fora de um contexto de falta total de recursos (pág. 20).
[7] - Cf. GENTILI, Pablo. O discurso da ‘qualidade’ como nova retórica conservadora no campo educacional in Neoliberalismo, Qualidade Total e Educação. Petrópolis, Vozes, 1994, pág. 151.
[8] - A avaliação dos estudantes por parte das instâncias governamentais não deveria deter-se em um ou outro aspecto do conhecimento curricular, mas procurar observar o maior número de elementos possíveis, desde o âmbito científico-tecnológico até o pessoal, passando pela capacidade de comunicação e expressão, pela criatividade, etc., inclusive porque os aspectos mais valorizados pelos testes poderão determinar as tendências curriculares e os próprios rumos do ensino a ser desenvolvido nas escolas e universidades.
[9] - Há um resultado comum entre as principais pesquisas educacionais realizadas entre os anos 1960 e 1970 (I.N.E.D. (Institut National d’Études Demographiques, França); relatório Coleman (E.U.A.); O.C.D.E. (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico); pesquisas britânicas (relatório Plowden, relatório Newson, relatório Robbins); e pesquisas em países socialistas (Cf. Lagneau-Markiewicz, Janine. Les pays socialistes de 1945 à 1970, in SAUVY, Alfred & GIRARD, Alain. Vers l’enseignement pour tous. Paris, Bruxelas: Elsevier Séquoia. 1974). A constatação comum, de uma forma geral, é a idéia de que a desigualdade de acesso à educação entre os grupos sócio-econômicos constitui um fato estatístico maciçamente irrecusável. Isso contraria a crença liberal de que apenas a expansão dos sistemas de ensino ou apenas a facilitação (legal ou material) de acesso, ou meramente as leis que regem o ensino, fossem em si mesmos fatores suficientes de democratização.
[10] - Baseamo-nos para esta análise no texto "O Ensino Religioso na escola deve ser: confessional? interconfessional? interreligioso?", de João Barros, in Revista da AEC, ano 2, no. 8, 1993, p. 7-79.
[1] - Cf. FERRETTI, Celso João. "A prática escolar frente à legislação". Revista da AEC, ano 17, no. 70, 1988, p. 21 - 26

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

CONHECENDO O PENSAMENTO DE JANET MOYLES

Entrevista - A pedagogia do brincar Janet Moyles.


         Mesmo já tendo se aposentado pela segunda vez, Janet Moyles não deixou de se envolver intensamente em projetos ligados à educação infantil. Professora emérita na Anglia Ruskin University, em Chelmsford, na Inglaterra, ela trabalha com educação pré-escolar tanto no Reino Unido quanto em outros países. "Faço parte de bancas examinadoras de teses de doutorado em diversas instituições e, dessa forma, continuo aprendendo através do trabalho de outras pessoas", conta. Além de ser responsável pelo website da Training, Advancement and Co-operation in Teaching Young Children (TACTYC, disponível em www.tactyc.org.uk), em março de 2010, Moyles será uma das anfitriãs de um congresso internacional intitulado Currículo na primeira infância: política e pedagogia no Século XXI - um debate internacional. Escritora prolífica, ela também tem diversos livros publicados, como A excelência do brincar, Só brincar? e Fundamentos da educação infantil, todos relacionados a atividades lúdicas e crianças pequenas e publicados no Brasil pela Artmed. Na entrevista a seguir, Janet Moyles fala sobre a importância do brinquedo para o desenvolvimento das crianças.

         Como o brincar deve ser usado no currículo dos primeiros anos da educação infantil?

         Brincar é uma parte fundamental da aprendizagem e do desenvolvimento nos primeiros anos de vida. As crianças brincam instintivamente e, portanto, os adultos deveriam aproveitar essa inclinação "natural". Crianças que brincam confiantes tornam-se aprendizes vitalícios, capazes de pensar de forma abstrata e independente, assim como de correr riscos a fim de resolver problemas e aperfeiçoar sua compreensão. Significa que os programas de educação infantil inicial devem estar baseados em atividades lúdicas como princípio central das experiências de aprendizagem. Isso é bastante difícil de conseguir na vigência de práticas excessivamente prescritivas em termos de conteúdo curricular. Crianças pequenas alcançam a compreensão através de experiências que fazem sentido para elas e nas quais podem usar seus conhecimentos prévios. O brincar proporciona essa base essencial. É muito importante que as crianças aprendam a valorizar suas brincadeiras, o que só pode acontecer se elas forem igualmente valorizadas por aqueles que as cercam. Brincar mantém as crianças física e mentalmente ativas.

         A brincadeira infantil deve ser sempre espontânea ou os adultos podem interferir no sentido de auxiliar a criança a construir novos conhecimentos?

        Existe uma grande diferença entre intervenção e interação. Os adultos devem interagir com as crianças durante as brincadeiras quando puderem fazer isso de uma maneira que não seja invasiva e que estimule a compreensão das crianças. Os adultos só devem intervir diretamente quando há necessidade de garantir a segurança das crianças ou de adequar os propósitos de inclusão. O brinquedo espontâneo fornece muitas informações sobre o que as crianças são capazes de compreender e fazer - somente de posse desse conhecimento é que os educadores têm condições de saber o que uma criança pode precisar e vai querer aprender depois.

         O que é importante que os adultos saibam para melhor aproveitar o potencial educativo das brincadeiras?

         É essencial conhecer o máximo possível sobre a criança e suas experiências anteriores, sua cultura e sua linguagem. Observar e ouvir a criança para descobrir no que ela está prestando atenção ou no que está interessada e, de vez em quando, fornecer determinados recursos ou criar um contexto para sustentar esses interesses são formas mediante as quais os adultos podem "ensinar" através do brincar. Fundamentalmente, uma dos principais funções dos educadores é arranjar tempo para conversar com as crianças quando a brincadeira precisa terminar, sobre o que estavam fazendo e o que pareciam estar obtendo com ela. Igualmente imprescindível é o subsequente planejamento dos educadores para ampliar e desenvolver as oportunidades dos alunos através de suas brincadeiras espontâneas, a partir da análise e avaliação das experiências lúdicas de cada dia.

         Existe um nível de excelência em relação às experiências lúdicas das crianças?

         As experiências das crianças podem ser consideradas "excelentes" quando elas tiverem começado a brincar por iniciativa própria e forem capazes de dar continuidade a uma determinada brincadeira no decorrer do tempo. Refiro-me a possivelmente várias horas e, às vezes, até mesmo dias: por exemplo, quando elas começam a desempenhar papéis de uma história de sua própria escolha e com o passar do tempo retornam a ela várias vezes, ampliando e desenvolvendo a temática e as dimensões da brincadeira. Outro exemplo é quando a criança escolhe fazer alguma coisa e retorna a seu modelo durante alguns dias, fazendo gradativas melhorias e acréscimos que lhe parecem atraentes.

         Qual o papel do adulto nesse processo?

         O papel do adulto é o de sustentar a brincadeira, observando as ações e ne­cessidades da criança para oferecer recursos adicionais (humanos ou materiais) que garantam a progressão na aprendizagem. À medida que brincam e agem sobre a realidade, as crianças devem ser incentivadas a narrar e dar sentido a suas próprias atividades. O foco central na fala permitirá que se desenvolva a metacognição. A genuína valorização do brincar das crianças permite-lhes desenvolver disposições positivas para aprenderem e serem ensinadas, capacitando-as a assumir a responsabilidade por sua própria aprendizagem. Aprender brincando é - e deve ser - uma viagem de descoberta para as crianças, que aprendem que aprender é algo que vale a pena e que, a fim de aprender, é preciso correr riscos e ser criativo. A excelência deve ser a de criança e educadores que aprendem juntos através de experiências lúdicas.

         Qual o papel do meio nas manifestações simbólicas das crianças?

         As culturas (do lar, da comunidade, do credo ou do grupo étnico) são à base de grande parte do brincar das crianças, tanto de modo positivo quanto de modo negativo. A cultura da escola e a socialização no ensino escolar podem representar um grande problema para algumas crianças, especialmente quando o ambiente escolar é muito formal em relação ao ambiente pré-escolar. Em alguns grupos étnicos, somente os contextos de aprendizagem formais são aceitos como "educação", sendo o brincar visto como algo "fútil", e não um processo de aprendizagem. Os educadores têm muito a fazer nesse contexto para permitir que os pais compreendam o valor do brincar e seu significado na aprendizagem.

         O que os professores podem fazer?

         Essa não é uma tarefa fácil, mas tirar fotografias das atividades das crianças e indicar o nível e profundidade da aprendizagem ao brincar com água pode ajudar os pais a compreender. O ambiente doméstico das crianças exerce uma forte influência sobre o seu potencial de aprendizagem e os significados que elas extraem do mundo a seu redor. As crianças simbolizam as realidades de sua vida através das brincadeiras. Crianças chinesas que brincam em uma área local vão querer usar "pauzinhos" e pratos pequenos, em vez de garfos e facas, por exemplo.

         Qual deve ser a formação do educador infantil para trabalhar diretamente com as crianças em escolas?

         No Reino Unido, as crianças de menos 5 anos estão em escolas privadas, mantidas por instituições, públicas ou voluntárias. Muitos dos profissionais que nelas trabalham não têm formação como professores, ainda que atualmente haja um movimento para garantir isso. Minha opinião pessoal é de que todos os que trabalham com crianças pequenas devam ter uma formação pedagógica formal - sou contra a própria palavra "treinamento", porque ela não reflete os níveis de conhecimento e compreensão mais profundos que, a meu ver, devem ser adquiridos, especialmente pelos que trabalham e brincam com crianças pequenas.

         Existe uma pedagogia própria para a infância?

         A pedagogia da infância inicial é a pedagogia do brincar. Seus elementos são o brincar espontâneo, o aprender brincando, o ensinar brincando, as intenções curriculares, a avaliação e as reflexões dos profissionais. O brincar exerce controle sobre a criança, sendo conduzido e mantido por ela. Ele é criativo, aberto e imaginativo. O papel do educador é disponibilizar recursos, ser um observador interessado (currículo e avaliação), interagir (se convidado) e compreender o brincar de uma perspectiva desenvolvimentista. É proporcionar recursos, interagir, ampliar o vocabulário e perceber as intenções curriculares na brincadeira. Por outro lado, ensinar brincando significa utilizar a alegria natural, inata da criança ao brincar, e garantir que as tarefas sejam apresentadas às crianças da maneira mais aberta possível. Essa forma de ensinar utiliza os recursos percebidos pela criança como "divertidos", e o papel do adulto é propor tarefas divertidas, relacioná-las 
ao currículo requerido e apresentar as tarefas de modo criativo e divertido. Esses são aspectos interligados, embora distintos, utilizados em um contexto educacional. É necessário planejamento em todas as etapas, mas ele difere conforme o papel do educador.

         Os conhecimentos formais podem ser articulados com uma cultura lúdica?
         Se por "conhecimentos formais" entende-se a capacidade de ler e escrever, fazer operações aritméticas, bem como ter conhecimento de ciência, história e geografia, então todos eles podem ser articulados a uma cultura lúdica. Conforme os recursos lúdicos oferecidos pela escola ou pelo ambiente pré-escolar, as crianças mobilizarão seu conhecimento anterior para criar um contexto lúdico no qual elas podem usar e articular o conhecimento curricular "formal".

         Que exemplos a senhora poderia dar em relação a isso?

         Crianças que têm a oportunidade de criar e desenvolver uma agência de turismo em sala de aula vão necessariamente utilizar e ampliar seus conhecimentos sobre lugares, linguagem (através de reservas), matemática (através dos preços das viagens), tempo e, potencialmente, conhecimento científico de voos, fretes, peso da bagagem e coisas desse tipo. Um ambiente ao ar livre montado como uma estufa de plantas pode proporcionar experiências "formais" em toda a extensão curricular, além de atividades lúdicas, como escavar, rastelar e plantar. Na verdade, é muito mais fácil proporcionar um programa de ensino amplo e equilibrado através desse tipo de atividade do que através de atividades praticadas na sala de aula ou em folhas de exercício. Experiências de aprendizagem semelhantes a essas que foram descritas têm mais chance de proporcionar às crianças com menos de 11 anos um leque mais amplo de habilidades e conhecimentos do que os programas de ensino baseados em matérias.

         Como à senhora entende a relação entre a brincadeira e a arte?

         Brincar é um processo muito criativo, assim como a arte é criativa, e não tem limites predefinidos. Ambos têm em comum a necessidade de flexibilidade e o desenvolvimento do pensamento eclético. A arte envolve tanto a compreensão que os artistas têm de si mesmos e de seu lugar no mundo quanto do resultado. De modo análogo, o brincar permite que as crianças aprendam sobre si mesmas, suas tolerâncias, suas habilidades e seu relacionamento com outras pessoas. A arte e o brincar são processos e, ainda que ambos possam ter um "produto" explícito, este não é necessário a nenhum deles. Mais do que isso, eles permitem que a pessoa envolvida, na atividade artística ou lúdica, utilize estratégias de tentativa e erro para aprender e desenvolver ideias. A arte e o brincar exigem que os participantes sejam imaginativos e oferecem oportunidades para que os envolvidos reflitam sobre sua própria aprendizagem e suas habilidades.

A EXCELÊNCIA DO BRINCAR


MOYLES. Janet R. [et al]. A excelência do brincar. Porto Alegre: Artmed, 2006. 248 p.

A professora titular de educação na University of Leicester, Janet R. Moyles, é responsável pela educação inicial e pela formação dos professores de educação infantil inicial. Seus livros incluem Só brincar? Publicado pela Artmed.
Moyles organiza um livro coletânea, onde há vários artigos escritos por estudiosos dessa temática que discuti o brincar como sendo essencial para a criança, tanto fora da escola, como no contexto educacional. Elucida que o brincar quando é mandado é diferente do brincar livre, do cotidiano, onde a estruturação, as regras, o tempo, tudo é feito pela própria criança. E como garantir essa excelência e a qualidade na provisão do brincar? Sendo um fator fundamental para a elevação da educação infantil e posterior.
No primeiro capítulo, o autor Peter K. Smith, professor de Psicologia, faz suas pesquisas em várias comunidades, com tipos diversificados de culturas, e por meio dessas pesquisas, demonstra que o brincar vai depender dessa cultura local, e das manifestações dos adultos frente a esse direito que é, e que deve ser de toda criança. Na maioria das sociedades, desta forma, o brincar é aceito como atividade infantil, porém sua importância não é reconhecida como parte fundamental do desenvolvimento cognitivo, social, entre outros.
A autora Hislam, professora de didática, faz seus estudos acerca de como está organizada a questão do gênero no brincar. Verificando os espaços do brincar de faz-de-conta em que há predominância feminina em detrimento à figura masculina. A autora alerta para que os educadores possam estar trabalhando essas questões de forma diversificada, para não fomentar os esteriótipos determinados pela sociedade.
Brown é diretor de uma escola de ensino fundamental, e realizou suas observações e estudos acerca do brincar no pátio, um dos poucos espaços tido pelas crianças para brincar livremente. Diz que, as brincadeiras e os jogos constituem a base em torno da qual giram as atividades sociais e culturais das crianças. E a forma em que as crianças lidam com os conflitos que envolvem a brincadeira determinará sua capacidade de construir relacionamentos, desenvolver maior competência e, conseqüentemente, conquistar status.
Anning é professora do ensino de artes para as primeiras séries, abre o segundo capítulo do livro, refletindo sobre o currículo nacional, desenvolvido por uma sociedade machista que não tem uma visão ampla sobre o brincar e suas conseqüências no desenvolvimento infantil e posterior, desta forma traz pressupostos relevantes para a discussão de um possível currículo alternativo baseado nos estudos de Gardner que defende a existência de oito tipos de inteligências, sendo elas: lingüística, lógico-matemática, musical/auditiva, visual/espacial, cinestésica, interpessoal, intrapessoal e intuititva/epiritual. Compor um currículo observando essas e tantas outras peculiaridades da educação infantil seria chegar ao ideal da educação.
Abbot é professora de didática em educação infantil, relata no seu artigo que, se o educador conhece o contexto das crianças e seus pais, as atividades que envolvem o brincar estarão sendo desenvolvidas com tranqüilidade. Defende também, que o brincar como oportunidade de construção cognitiva é essencial para o currículo da educação infantil.
Responsável pela disciplina de educação fundamental, Kitson escreve seu artigo sobre a importância do brincar sociodramático, em que a criança faz uso da sua fantasia. Estudos aprofundados por Freud, considerado o maior psicalanista de todos os tempos, enfatiza que, por meio do brincar sociodramático, os educadores podem criar uma situação e uma motivação que estimularão as crianças a se comportarem e a funcionarem em um nível cognitivo acima da sua norma.
Heaslip é consultor sobre a primeira infância, e desta forma acredita que apesar de atualmente a televisão está tomando conta dos espaços, os quais as crianças poderiam estar brincando, a escola precisa empregar uma avaliação de baixo para cima, sendo assim, a escola estará desempenhando sua responsabilidade cada vez maior de garantir que elas não sejam privadas das oportunidades de descobrir a respeito de si mesmas e do seu mundo e que tenham o direito de aprender de uma maneira que seja apropriada para elas, por meio do brincar.
Hall é professor titular na School of Education, argumenta que o letramento deve fazer parte do cotidiano das crianças, e não, empurrado de goela abaixo. Desta forma, o autor reforça a idéia de um currículo com fundamentos no brincar, e mais uma vez é visto a defesa do posicionamento do professor, o qual precisa reconhecer que o brincar realmente oferece às crianças experiências ampliadas.
O diretor do Departamento de Arte e Design no Institute of Education, Prentice, acredita e defende que o ensino de artes deva fazer parte do currículo nacional para a educação infantil. E as atividades que serão desenvolvidas sobre artes, dando as crianças a possibilidade de conhecer formas tridimensionais, bidimensionais, cores, entre outras, deverão ser planejadas pelo professor de forma a “prender” o aluno nessas atividades.
Riley é professor de no curso de pós-graduação em educação e Savage é professora de didática da educação de ensino fundamental no Institute of Education, eles desenvolvem o seu artigo demonstrando em forma de algumas pesquisas a importância e o interesse das crianças nas atividades de ciências, acreditando, ser essa uma temática a ser explorada não apenas do ensino fundamental com crianças de 11 anos em diante, mas sim fazer um trabalho planejado desde a educação infantil. Defendem que essas atividades devam ser bem planejadas, sistematizadas e estruturadas, para proporcionar uma verdadeira aprendizagem científica convincente e apropriada.
Griffiths é professora de educação na University of Leicester e desenvolve um rico trabalho em relação a matemática e o brincar, no seu artigo ela também, demonstra algumas atividades com relação à temática desenvolvida. Acredita també, que existam cinco fatores-chave para se defender as vantagens de aprender a matemática por meio do brincar, entre eles estão: propósito, ou seja, tudo que fazemos fica mais fácil de se aprender quando se tem um propósito, e o propósito das crianças é sempre o divertimento; contextualizar as atividades através do brincar, ajuda as crianças entenderem os vínculos entre idéias concretas e abstratas. Os demais fatores-chave estão explicitados acerca do controle e a responsabilidade, tempo e atividade prática.
Pascal e Bertram ambos são professores de educação no Worcester College of Higher Education e no seu artigo eles se focalizam em destacar dez dimensões da qualidade do brincar, e defende que as mesmas estão separadas para melhor serem entendidas, mas no trabalho pedagógico elas são vistas inter-relacionadas. A primeira dimensão são as metas e objetivos, esta dimensão refere-se às declarações escritas e faladas a respeito de políticas, em um ambiente em que as metas e os objetivos da provisão do brincar são explicitados. A segunda dimensão é o currículo esta dimensão tem a ver com a variedade e o equilíbrio das atividades lúdicas oferecidas e com as oportunidades de aprendizagem que elas proporcionam às crianças. A terceira dimensão são as estratégias de aprendizagem e ensino esta dimensão tem a ver com o modo como o brincar é organizado e estruturado para incentivar a aprendizagem e descoberta. A quarta dimensão é o planejamento, avaliação e manutenção de registros esta dimensão examina como o brincar é planejado e questões com quem está envolvido no processo do planejamento e em que média o planejamento está baseado na avaliação anterior da atividade lúdica. A quinta dimensão se refere a equipe esta dimensão focaliza as oportunidades de envolvimento da equipe na atividade lúdica das crianças. A sexta dimensão refere-se ao ambiente físico examina o contexto em que o brincar ocorre. A acessibilidade, as condições e a adequação dos equipamentos lúdicos são documentadas. A sétima dimensão são os relacionamentos e interações esta dimensão examina como as crianças e os adultos interagem em seu brincar. A oitava dimensão refere-se às oportunidades iguais, ou seja, à maneira pela qual o brincar reflete e celebra a diversidade cultural e física e contesta estereótipos. A nona dimensão se refere a ligação e parceria com os pais esta dimensão focaliza a natureza da parceria com os pais e as maneiras pelas quais eles, e outros membros da comunidade local, estão envolvidos nas atividades lúdicas. A décima dimensão refere-se ao monitoramento e a avaliação esta dimensão examina os procedimentos pelos quais monitoramos e avaliamos a qualidade e a efetividade das políticas lúdicas. No decorrer do artigo os autores desenvolvem um modelo de avaliação e melhoramento do brincar, em que o processo de refletir, justificar e narrar aumente o entendimento profissional dos educadores e que os mesmos se tornem mais confiantes, mais conhecedores e mais articulados em sua defesa da importância e da excelência do brincar na educação infantil.
Hurst é professora no Goldsmiths College, University of London no seu artigo relata algumas estratégias de observação do brincar na primeira infância, relata que os educadores têm muita dificuldade para fazer a observação principalmente quando os mesmos estão sob pressão devido a recursos inadequados de equipe, acomodação, espaço ao ar livre e equipamentos. No decorrer do artigo a autora disponibiliza alguns formulários de observação, que precisam ser o mais simples possível. Desta forma termina o seu artigo defendendo o brincar, e solicitando aos educadores que nos seus estudos, tentem convencer os pais da importância do brincar na aprendizagem.
Bruce é ex-diretora do Center for Early Childhood Studies no Froebel Institute defende de forma geral o brincar livre, em que a criança irá contextualizar o brincar de forma que tenha maior significado para ela é o brincar de fluxo livre. Segundo Erikson, por meio do nosso brincar durante a infância nós nos tornamos parceiros do nosso futuro. A autora desenvolve uma preocupação em relação ao pouco tempo que as crianças da sociedade atual tem para brincar e fluxo livre, ou seja, elas estão cada vez mais dentro da escola formal. E mais uma vez é visto a defesa de um currículo apropriado e de qualidade. Enfatiza também que uma sociedade onde as crianças não brincam de fluxo livre provavelmente desmoronará.
No posfácio Moyles na tentativa de concluir o livro, atividade essa complexa, a autora demonstra concordar com os demais artigos, no que se refere à tentativa de defender a excelência do brincar. E alerta aos professores o valor que existe no brincar infantil e como ele pode ser transformado em um poderoso instrumento de aprendizagem.
Por fim a autora deixa uma fala de uma criança para demonstrar o que é o brincar para ela.
O livro “A excelência do brincar” tem uma leitura leve, prazerosa, e acima de tudo reflexiva o que possibilita aos educadores um novo olhar sobre o brincar e as verdadeiras possibilidades que o mesmo traz na vida da criança e posteriormente.
Este livro é de suma importância e não pode faltar nas leituras de todos os educadores mundiais, que precisam se inteirar das questões que envolvem a educação infantil nas muitas facetas que envolvem essa etapa da educação. Para os pais, é recomendada a leitura desse livro para desmistificar a idéia de que o brincar não leva a aprendizagem. E para que tanto educadores, como pais se envolvam mais no mundo do brincar.